O terror da ruptura dos rituais fúnebres na pandemia de covid-19
DOI:
https://doi.org/10.69751/arp.v14i27.5749Resumo
No fim de 2019, o coronavírus surgiu na China desencadeando uma pandemia global, devido à sua alta taxa de contágio. As medidas de isolamento e distanciamento social foram implementadas para conter a propagação do vírus, resultando em mudanças significativas nas rotinas sociais. A necessidade de distanciamento físico afetou drasticamente as relações interpessoais, especialmente durante momentos de perda, como funerais. Diante disso, as restrições impostas pela pandemia interromperam ou dificultaram as despedidas e os rituais fúnebres, impactando profundamente a maneira como as pessoas vivenciam e lidam com o luto, que é compreendido pela psicanálise como a reação apresentada pelo sujeito diante da perda de uma pessoa ou abstração vinculada a essa ausência. Assim, a não realização desses ritos durante a pandemia gerou dificuldades na simbolização da perda, resultando em fantasias de medo, terror, culpa e dor. Este estudo buscou compreender, por meio da análise psicanalítica, os impactos que a falta e/ou a não realização dos ritos de morte ocasionaram durante o período da pandemia. A natureza desta pesquisa é aplicada, com abordagem qualitativa, objetivos de cunho exploratório e procedimentos de estudo de campo. A partir da análise de dados coletados em quatro entrevistas, examinou-se como os participantes enfrentaram o falecimento de entes queridos, a causa da morte e a experiência das cerimônias de despedida afetadas pelo distanciamento social. Os resultados destacaram sentimentos como estresse, ansiedade, tristeza, desamparo, raiva e impotência relacionados ao luto durante o isolamento social. Observou-se uma dificuldade na concretização psíquica da perda e na elaboração do luto, ressaltando a importância dos rituais fúnebres na aceitação da irreversibilidade da morte. Concluiu-se que tais rituais desempenham um papel fundamental no atendimento às necessidades psicológicas e sociais dos indivíduos, enfatizando sua importância durante os períodos de crise, como a pandemia.